O cientista político Prof. Dr. Paulo Kramer postou na rede WhatsApp “Água Limpa”, integrada por militares e intelectuais civis, oito indagações de cunho estratégico, atinentes à nova conjuntura mundial após a investidura de Donald Trump na presidência dos Estados Unidos — tratou-se de uma instigante provocação do Dr. Kramer.
A rigor, cada questionamento mereceria um artigo analítico, entretanto, tive a ousadia de postar respostas simples e objetivas, que poderiam fazer parte de uma primeira abordagem para o desenvolvimento de uma resposta adequada. O resultado é apresentado a seguir.
[P1]
Será que o acordo Estados Unidos-Ucrânia sobre minerais estratégicos, recentemente anunciado, garantirá a segurança ucraniana contra futuras invasões russas?
[R1]
Um possível acordo Estados Unidos-Ucrânia sobre minerais estratégicos pode garantir a segurança ucraniana contra invasões russas no curto prazo, até cerca de 6 anos. Em médio e longo prazos, independentemente de Putin ou de quaisquer substitutos, observando-se os dados históricos dos últimos séculos, nada é garantido.
[P2]
Será que Trump deseja mesmo inserir uma cunha entre Rússia e China, com o objetivo de isolar os chineses? Caso sim, qual a chance dessa manobra dar certo?
[R2]
O que tem na cabeça de Trump e de seus assessores, não está perfeitamente claro. É certo que eles precisam tentar uma ou algumas medidas para se contrapor aos chineses. Do ponto de vista dos chineses, é provável que o objetivo principal seja a prevalência econômica no mundo. Para tanto, entre outras medidas, uma das mais importantes é o fortalecimento militar. De qualquer maneira, é extremamente difícil imaginar, conceber e desencadear procedimentos para impedir que os chineses atinjam seus objetivos — afinal, a história chinesa começou em Xian, antes de Cristo; portanto, eles jamais desistiram de tentar ter o mundo a seus pés, tendo a história lhes ensinado a fazer face aos grandes desafios. Estaria Trump, especificamente, tentando navegar na contramão de Nixon e Kissinger? É difícil imaginar chance de êxito.
[P3]
Alguma chance de a Ucrânia retomar pela via da negociação diplomática o território que a Rússia invadiu em fevereiro de 2022?
[R3]
A retomada, pela Ucrânia, dos territórios invadidos em fevereiro de 2022, pela via diplomática — ou por qualquer outra — é extremamente improvável. O alcance geográfico, militar, econômico e estratégico da invasão russa é elevado suficientemente, de tal sorte que dificilmente os russos renunciariam ao que conquistaram.
[P4]
Como avaliar a solidez do compromisso da Europa Ocidental com a segurança ucraniana em face da Rússia?
[R4]
Os países europeus ocidentais mais relevantes têm dois grandes problemas: as invasões dos refugiados e similares e a invasão dos russos na Ucrânia. Os dois problemas são cruciais e de difícil enfrentamento. Tudo indica que, sem o apoio dos Estados Unidos, a Europa não tem poder para bancar a segurança da Ucrânia em face da Rússia. É difícil imaginar como menos de 500 ogivas nucleares possam se contrapor a mais de 5000 artefatos similares. Essa dificuldade é agravada pela falta de independência energética.
[P5]
Será que a Ucrânia está fadada a se conformar com a perda de território para a Rússia como preço para a paz? Mais: os ucranianos podem confiar numa paz duradoura com os russos?
[R5]
Se os Estados Unidos mantiverem o posicionamento recém-adotado por Trump, a Ucrânia terá que se conformar com a perda de território para a Rússia. Entretanto, a paz duradoura com os russos é improvável e impraticável, quando consideramos contextos de médio e longo prazos.
[P6]
Estaria a Ucrânia fadada, também, a nunca se tornar membro da Otan? E da UE?
[R6]
No curto prazo, a Ucrânia tem que renunciar ao ingresso na OTAN e na UE. Em médio e longo prazos, depende da evolução mundial. É provável que a Europa Ocidental e “Oriental” se mantenham — como de resto ocorreu ao longo do século XX. Nesse sentido, a tendência seria a Ucrânia não ingressar na Europa Ocidental, mesmo em futuro distante. Ressalve-se que, entre outros, o episódio do Holodomor jamais será esquecido. Então, até que ponto, a Ucrânia é comparável à Polônia?
[P7]
Na opinião de vocês, Taiwan será a ‘próxima Ucrânia’?
[R7]
A prevalência econômica no mundo requer que os chineses sejam igualmente fortes no campo militar, o que facilitaria uma possível invasão de Taiwan. Entretanto, não é preciso invadir o território taiwanês para que haja prevalência chinesa na ilha; pelo contrário, a invasão impactaria de forma negativa o objetivo fundamental. Então, é razoável asseverar que, provavelmente, os chineses não invadirão Taiwan. Basta lembrar, que eles tiveram paciência e prudência em relação a Hong Kong e agora estão a cavaleiro das decisões nessa cidade-estado, sem a necessidade de invasão.
[P8]
Lembrando o fiasco de Biden no Afeganistão (2021), como uma ‘mediação’ de Trump na guerra Rússia X Ucrânia pode impactar sua popularidade na opinião pública doméstica?
[R8]
Na guerra Rússia x Ucrânia, não há e não haverá tropas americanas. Tudo indica que as pressões do Trump sobre o Zelenski tiveram efeito positivo. Há pois a possibilidade de cessar-fogo nessa guerra; bem como da exploração de metais estratégicos dos ucranianos em favor dos Estados Unidos. Há grande chance de impacto positivo na popularidade de Trump entre os americanos; claro, dependendo da economia interna americana que afeta mais decisivamente o cotidiano dos cidadãos; e por conseguinte, é mais relevante para eles do que o contexto internacional.
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