É frequente a ideia de que o primeiro comandante constrói o perfil do jovem oficial em início de carreira; e, nesse sentido, o aprendizado com as virtudes desse comandante condicionam o prosseguimento de uma trajetória bem-sucedida. No meu caso, a passagem pela primeira organização pode ser considerada um percalço. Houve aprendizado! Aprendi como não se deve agir; aprendi como não ser um bom exemplo; aprendi como evitar os vícios éticos; e aprendi como me posicionar diante dos pequenos e grande desafios.
Pela gravidade do relato, é razoável tratar dessa questão? Não seria melhor omiti-la de meus registros? Devemos temer a verdade?
Relembrei-a recentemente, depois de deixá-la no limbo por cerca de 50 anos.
Um advogado bem-sucedido, antigo sargento que serviu na 4ª. Cia Me Mnt nesses idos da década de 1970, teve a iniciativa inédita de reunir alguns oficiais, sargentos e uma expressiva parcela de soldados que lá serviram nessa época, para a celebração dos 50 anos da baixa do serviço militar inicial. A celebração foi no quartel da extinta 4ª. Cia Me Mnt — em década recente, substituída por um Batalhão Logístico.
Fui convidado e compareci. Encontrei o Dutra e o Ailto (este, não o via há mais de 40 anos). Não reconheci os antigos soldados — claro, em face dos cabelos brancos ou da falta deles, da forma corpórea sob o impacto de mais de meio século! Eles se declararam empresários, comerciantes, fazendeiros e até diretor de escola.
Foi emocionante receber vários agradecimentos pela influência que tive no desencadeamento de carreiras pujantes e recompensadoras.
Um deles me chamou de lado para lembrar que, no processo de incorporação ao serviço militar, eu determinei que ele fosse para o grupo daqueles que seriam dispensados, dado que ele já tinha ultrapassado os 20 anos de idade. Ele se dirigiu a mim e — nas palavras dele — implorou para servir na 4ª. Cia Me Mnt. Eu concordei e ele foi acolhido. Ele relatou também que, passados alguns meses, eu cruzei com ele no quartel e dei-lhe um livro com a recomendação que lesse e relesse tão logo fosse possível. Em realidade, era uma apostila para concurso. Aí começou sua evolução pessoal e profissional. Ele era semianalfabeto, começou a estudar, atingiu uma condição razoável de escolarização e agora era dono de empresa transportadora, com algumas dezenas de caminhões de transporte.
Outro afirmou que, após a baixa do serviço militar, graduou-se em Pedagogia, tornou-se professor e depois diretor de escola pública em Brasília. Afora, o agradecimento pelos estímulos, fui convidado para dar uma palestra em sua escola, na volta para Brasília.
Enfim, relembrei os percalços, mas relembrei sobretudo o êxito vivenciado na alvorada de minha trajetória militar.
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Tragédia em Ponta Porã
No segundo semestre de 1974, o capitão Paulo de Matos Coelho, recém investido na condição de comandante da 4ª. Companhia Média de Manutenção (4ª. Cia Me Mnt), chegou um pouco mais cedo para o expediente e me disse que no dia anterior, domingo, o comandante da 4ª. Divisão de Cavalaria (4ª. DC), general de brigada Ângelo Irulegui da Cunha, o convocara e determinara que escalasse uma equipe experiente (um oficial e dois sargentos) para apoiá-lo em inspeção relativa à situação de viaturas e armamentos, nas organizações militares, por ocasião da visita que ele faria ao sul do Estado, acompanhando o comandante da 9ª. Região Militar (9ª. RM), general de divisão Alberto Carlos de Mendonça Lima, que acabara de assumir o comando regional. O capitão Coelho perguntou se eu desejava participar da missão. Como fiquei em silêncio, ele lembrou que o trajeto daria para eu completar 20 horas de voo, o que me daria um adicional nos vencimentos dos doze meses do ano seguinte. Eu respondi que não interessava o ganho em tela; importava mais a necessidade do serviço, uma vez que eu estava acumulando as funções de subcomandante e fiscal administrativo da companhia.
Ele falou para irmos ao Pelotão de Manutenção para consultar o tenente Mário Bueno de Camargo — paraquedista e mecânico experiente, operoso e com disposição incomum — se ele poderia ir. Dirigimo-nos para o Pelotão de Manutenção, onde o tenente Camargo era adjunto. Ao ser consultado, ele não hesitou e, com entusiasmo, propôs-se a participar. Como eu sabia que ele tinha vários problemas de saúde na família (envolvendo a esposa e dois dos sete filhos), chamei-o de lado e indaguei-lhe como estava o pessoal em casa. Ele assegurou que uma filha iria ao hospital para exames, pois em face de um problema adicional, ela tinha que extrair vários dentes da arcada superior, mas que isso não o impediria de viajar, pois ele chamaria a sogra, que morava em Porto Epitácio-SP, para acompanhar o processo; então, disse-lhe que ele deveria permanecer em Campo Grande. Voltei-me para o capitão Coelho e asseverei que o tenente Camargo não deveria ir; portanto ele poderia indicar meu nome para a missão.
Nesse instante, o tenente Flávio José de Carvalho, diligente comandante do Pelotão de Manutenção, pediu a palavra e afirmou que, numa rara exceção — por ser oficial R2, formado em Núcleo de Preparação de Oficial da Reserva (NPOR) — ele seria transferido para o Rio de Janeiro. E como ele não conhecia o sul do Estado, solicitou que eu desistisse da missão em favor dele. Dirigindo-me ao capitão Coelho, disse que concordava com o pedido do Flávio e que ele poderia receber o encargo. O Flávio ressaltou que gostaria de indicar os sargentos Hércules Santos de Campos e Severiano Francisco Cruz, considerados os mais qualificados e comprometidos mecânicos de viatura e armamento, respectivamente. E assim foi feito, Flávio, Hércules e Cruz foram designados.
No dia da viagem, 17 de setembro de 1974, a aeronave C-115 Búfalo pilotada pelo coronel aviador José Hélio Macedo Carvalho, comandante da Base Aérea de Campo Grande (BACG) — transportando o general Mendonça Lima, o general Irulegui, grande parte dos oficiais integrantes dos estados-maiores da 9ª. RM e da 4ª. DC e os 3 integrantes da 4ª. Cia Me Mnt, num total de 19 militares — partiu de Campo Grande para Três Lagoas (1º./4º. Regimento de Cavalaria Motorizada); depois seguiu para Aquidauana (9º. Batalhão de Engenharia de Combate), onde pernoitou; e, no dia 18 de setembro, decolou para Amambai (17º. Regimento de Cavalaria). Lá chegando, o tempo estava completamente encoberto; então ele seguiu para o destino alternativo, que era Ponta Porã (11º. Regimento de Cavalaria). Nessa cidade, o tempo estava começando a fechar e o sargento da Aeronáutica baseado em terra recomendou que o avião seguisse para outro destino alternativo.
O coronel Macedo decidiu tentar achar uma abertura na névoa que encobria a localidade, pousar e, assim, cumprir a missão. Na tentativa que se seguiu, o avião desceu em demasia e colidiu com um poste metálico — há a versão de que a colisão foi com uma caixa d’água suspensa — e espatifou-se no solo causando a morte de todos os militares, à exceção do sargento Shiro Ashiushi, mecânico da aeronave, que foi lançado pela janela que fica quase sobre a cabeça dos pilotos. Ele se quebrou todo, mas sobreviveu à custa de um longo período de recuperação.
Ao chegar a notícia do acidente, levei a informação ao capitão Coelho. Ele levou um choque, permaneceu mudo durante um bom tempo e, depois, perguntou o que faríamos. Disse-lhe que deveríamos reunir a Companhia, transmitir o infausto ocorrido e planejar as medidas para o sepultamento dos companheiros que perderam a vida. Recebi a aprovação e determinei o toque de clarim, para a reunião. No auditório, o capitão Coelho começou a falar, mas sua voz completamente embargada me levou a assumir a palavra. Com uma presumida e aparente calma, transmiti o infausto ocorrido e determinei a preparação das medidas para a participação do efetivo total da Companhia — previsão de chegada dos corpos, eventos subsequentes, horários prováveis e demais aspectos relevantes. Após a liberação, assisti ainda perplexo a saída dos companheiros em silêncio, só quebrado pelo arrasto cuidadoso dos calçados sobre o piso da dependência.
Tomamos conhecimento de que a maioria dos falecidos era de outros estados. Então, haveria transporte aéreo dos corpos, por conta da 9ª. RM e BACG, para Recife, Rio de Janeiro e Porto Alegre. O Flávio era oriundo do Rio de Janeiro e seguiria para sua cidade natal. Escalamos o tenente Jarbas para acompanhá-lo, participar da entrega do corpo para a família e representar os integrantes da 4ª. Cia Me Mnt no enterro. Em face de doação dos jazigos pela prefeitura municipal da cidade, os campo-grandenses — cerca de meia dúzia, aí incluídos os sargentos Hércules e Cruz — seriam sepultados no aprazível cemitério Parque das Primaveras, inaugurado um ano antes.
Pessoalmente, fiz contato com as famílias dos nossos dois sargentos. Diante da oferta de apoio, a esposa do sargento Cruz afirmou que seu esposo gostava do que fazia, vibrava com a profissão e, por isso, gostaria que ele tivesse tudo o que tinha direito, o que incluía as honras militares na hora do sepultamento. A esposa do sargento Hércules expressou enorme revolta, culpou o Exército por sua morte e recusou de forma inapelável as honras militares. A decisão do capitão Coelho foi planejar o sepultamento de ambos de acordo com as opiniões das esposas. O primeiro seria sepultado no cemitério Parque das Primaveras, no âmbito do evento coletivo sob as ordens da 9ª. RM; e o outro seria sepultado duas horas antes no cemitério Santo Amaro, onde a família era detentora de jazigo. No caso do sargento Hércules, foi asseverado à esposa que ela não poderia impedir a presença de integrantes da 4ª. Cia Me Mnt.
Os dezoito corpos chegaram em Campo Grande no dia seguinte ao acidente e foram levados para o Círculo Militar, localizado no bairro Amambaí, onde foram velados até a hora de seguir para a Base Aérea, de onde partiriam de avião para as localidades de origem; e para os cemitérios locais, no caso dos campo-grandenses.
Ao chegarmos no aeroporto, a primeira constatação foi que o tenente Jarbas, designado para acompanhar o tenente Flávio, não compareceu — depois descobriu-se que ele teria ficado amedrontado por ter que seguir com vários mortos na viagem aérea. Nesse momento, ofereci-me como voluntário para acompanhar o Flávio. Porém, houve um contratempo. A esposa do sargento Hércules procurou-me desesperada e aos prantos, arguindo que fora tomada uma decisão, no âmbito da 9ª. RM, contrária aos desejos da família: seu marido seria sepultado no cemitério Jardim das Primaveras, em evento coletivo e não no cemitério Santo Amaro, conforme pactuado. Imediatamente, dirigi-me ao general de brigada Lauro Rocca Dieguez, comandante da 2ª. Brigada Mista (desde 2022, transformada em 18ª. Brigada de Infantaria do Pantanal), com sede em Corumbá — que, em face da morte dos dois generais, comandantes em Campo Grande, passara a responder pelo comando da 9ª. RM — e expliquei-lhe o planejamento do sepultamento dos dois sargentos da 4a. Cia Me Mnt. Ele ressaltou que a decisão de comando estava tomada e seria cumprida. Como oficial jovem, mas com audácia, ponderei com firmeza até excessiva, enfatizando que o regulamento beneficiava o pleito da família e que a decisão, salvo juízo controverso, estava errada. O seguinte diálogo se sucedeu:
— Tenente, quantos anos de serviço você tem?
— 8 anos de serviço!
— Pois, eu tenho 34 anos de serviço, sendo um ano nos campos de batalha da Itália. Então, você vai fazer o que vocês planejaram, mas me comunique os horários precisos. Eu comparecerei ao enterro do seu sargento. E se alguma coisa der errado, você será preso!
— Sim senhor! Cumprirei a missão e não serei preso! Permissão para ir embora!
— Para ir embora não! Permissão concedida para cumprir a missão e ser preso se for o caso! Essa decisão é minha!
— Sim senhor!
Prova de 100 m rasos, na Olimpíada de Berlim
É curioso esclarecer que o general de brigada Lauro Rocca Dieguez, comandou a 2ª. Brigada Mista de 03/06/1974 a 24/02/1976.
Ele foi antecedido pelo general de brigada Oswaldo Ignácio Domingues, que comandou essa Brigada de 15/05/1973 a 7/05/1974.
O general Domingues participou da competição de 100 m rasos, na Olimpíada de Berlim, em 1936. Ele quase foi para a final com Jesse Owen, o ganhador da prova, para tristeza e decepção de Adolf Hitler, presente no evento.
Diante do ocorrido, o acompanhamento do tenente Flávio ficou comprometido e esquecido. Era preciso pensar e agir. O enterro do sargento Hércules seria daí a quatro horas mais ou menos; então ele seria deslocado para o cemitério Santo Amaro, onde continuaria sendo velado por algum tempo. E o do sargento Cruz seria daí a seis horas, no evento coletivo do cemitério Parque das Primaveras.Após passar pela 4a. Cia Me Mnt, para ultimar os preparativos e verificar se as determinações do Capitão Coelho estavam sendo cumpridas, dirigi-me para o cemitério Santo Amaro. Lá chegando, encontrei um quadro dantesco: duas senhoras, a esposa e outra não identificada, estavam aos prantos, gritando e se pegando diante do cadáver; cada uma delas querendo a primazia de quem não poderia mais fazer qualquer opção. E relembrando a afirmação de que não seria preso, chamei o subtenente Castaño e disse:
— Castaño! Use toda sua experiência, equilíbrio e sabedoria de avô jovem, com que você recebeu na Fiscalização Administrativa este aspirante a oficial, recém-graduado, que se achava dono do mundo, mas que provavelmente precisaria aprender a ser dono do próprio nariz! Retire essa intrusa daqui e leve-a para bem longe! Evapore-a!
Passados dez minutos, já a meia hora do sepultamento, chegou o general Dieguez. De imediato, procurou-me, indagando se estava tudo bem. Respondi-lhe que, sem sombra de dúvida, as ordens dele jamais deixariam de ser cumpridas.
Enfim, depois do sepultamento coletivo, no cemitério Parque das Primaveras, encerrou-se um episódio lamentável e tormentoso. Só não encerraram as lembranças que, não raro, levam a profundas reflexões sobre o sentido da existência; sobre o que é realmente relevante; sobre o que deve prevalecer na trajetória humana. Sempre que rememoro esse trágico evento, penso na conhecida e recorrente asserção de que “entre o céu e a terra há tantos mistérios que a nossa vã filosofia mal imagina”.
Ademais, pelas oportunidades que recusei para colocar-me no epicentro da tragédia, relato esses dramáticos eventos, com alívio; porém com dor, solidária com quem perdeu entes valorosos e queridos. Com emoção, homenageio os bravos guerreiros que sucumbiram no cumprimento do dever. Eles são o eterno exemplo para seus sucessores. Eles são a inspiração para quem a disposição para servir é a glória eterna!
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Atividades na CRO/12
Após o término da graduação em Engenharia Elétrica no Instituto Militar de Engenharia (IME), no final de 1981, fui classificado na Comissão Regional de Obras/12ª. RM (CRO/12), em Manaus-AM.
Ressalte-se que o efetivo de oficiais encarregados da atividade-fim nas Comissões Regionais de Obras é integrado por engenheiros das especialidades de Engenharia Militar de Construção (Engenharia Civil) e de Engenharia Militar Elétrica.
Adicionalmente, convém esclarecer que há doze Comissões Regionais de Obras no Exército, sendo uma para cada uma das doze Regiões Militares (CRO/1, CRO/2, … e CRO/12, subordinadas, respectivamente, às seguintes Regiões Militares: 1ª. RM - Rio de Janeiro; 2ª. RM - São Paulo; 3ª. RM - Porto Alegre; 4ª. RM - Belo Horizonte; 5ª. RM – Curitiba; 6ª. RM – Salvador; 7ª. RM – Recife; 8ª. RM – Belém; 9ª. RM - Campo Grande; 10ª. RM – Fortaleza; 11ª. RM – Brasília; e 12ª. RM - Manaus).
Em 1982, assumiu a chefia da Comissão, o coronel Pedro Paulo Pamplona Vieira Peixoto. Na gestão dele, a maioria das obras eram realizadas por administração direta, ou seja, não havia contratação de empresa de construção civil; a gestão e condução de obra era responsabilidade do respectivo engenheiro da Comissão, que contratava os operários e coordenava os trabalhos. No caso das obras em andamento, de maior porte, na fronteira do País, os engenheiros se revezavam na condução e fiscalização dos trabalhos, passando entre 10 e 30 dias no local, sendo transportados em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) que, normalmente, faziam o trajeto ida e volta a cada 30 dias. Na localidade de Tabatinga, na fronteira tríplice Brasil, Colômbia e Peru, estavam sendo construídas casas destinadas a oficiais e sargentos do então Comando de Fronteira do Solimões/1º. Batalhão Especial de Fronteira (C F Sol/1º BEF) — em 1992, transformado em Comando de Fronteira do Solimões/8º. Batalhão de Infantaria de Selva (C F Sol/8º. BIS).
Em uma ocasião em que fui para Tabatinga, para a fiscalização das obras, o avião da FAB deixou de cumprir a missão subsequente habitual. Então, para não permanecer cerca de 20 dias quase sem o que fazer, em Tabatinga, telefonei para o coronel Peixoto e propus que eu voltasse para Manaus por intermédio de companhia aérea comercial, pagando a passagem com meus recursos e, quando eu chegasse, ele determinaria o devido ressarcimento. Ele aprovou a proposta. Passados 40 dias do retorno, como não houve a contrapartida, pedi ao auxiliar do coronel Peixoto providência para que eu recebesse o valor despendido com a passagem aérea. O citado auxiliar disse que o coronel Peixoto não faria o pagamento. Então, na reunião matinal do dia seguinte, relembrei a ele o compromisso e apresentei a demanda para recebimento do respectivo valor. A atitude do coronel Peixoto foi inaceitavelmente crítica, em tom de voz alto e com o indicador em riste — o que ele já tinha feito antes com mais de um oficial subordinado. Reagi da mesma maneira que ele, disse-lhe que não concordava com esse tipo de tratamento e que me ausentaria da reunião. Por certo, isso caracterizou uma transgressão da disciplina. À tarde, solicitei audiência com o coronel Peixoto e informei a ele que, no dia seguinte, estava seguindo para Ipiranga — sede do 2º. Pelotão Especial de Fronteira (2º. PEF), às margens do rio Içá, que cruza a fronteira do Brasil com a Colômbia — onde estávamos construindo os pavilhões do Pelotão e casas para os militares. Adicionalmente, disse-lhe que quando retornasse, punido ou não, solicitaria a minha transferência da CRO/12, pois não desejava mais trabalhar com ele.
Quando voltei de Ipiranga, o coronel Peixoto não me puniu. Passados dois meses, ele foi demitido da chefia da CRO/12 por desavença com o general que passou a responder pelo comando da 12ª. Região Militar. Recebi o elogio habitual de despedida, com referência positiva a meu desempenho profissional, porém com a orientação de que “eu deveria alterar aspectos de meu comportamento se quisesse ter a carreira militar bem-sucedida”. Em realidade, o elogio soou como uma espécie de punição informal.
No que concerne à exoneração prematura do coronel Peixoto da chefia da CRO/12, ela se deveu ao fato de que, na construção da nova sede da Comissão, na avenida Coronel Teixeira, nas proximidades do bairro de Ponta Negra, em Manaus (antes, a sede se localizava na rua Joaquim Nabuco, no centro da cidade), houve um acidente entre um caminhão da CRO/12 e um automóvel do 2º. Grupamento de Engenharia de Construção (2º. GEC), por culpa do motorista do caminhão. O coronel Peixoto fez saber ao comandante do 2º. GEC que providenciaria o ressarcimento do elevado montante requerido para a recuperação do automóvel. O tempo passou e o coronel Peixoto desistiu de cumprir a promessa.
Em face do falecimento da esposa, o comandante da 12ª. Região Militar (12ª. RM) pediu sua transferência imediata de Manaus para Fortaleza. Em consequência, o comandante do 2º. GEC passou a responder pelo comando da 12ª. RM (escalão ao qual a CRO/12 era diretamente subordinada). Com essa autoridade ampliada, uma vez mais, o comandante do 2º. GEC tentou obter do coronel Peixoto o ressarcimento prometido. Não houve êxito. Então, o comandante do 2º. GEC solicitou ao Departamento Geral do Pessoal, em Brasília, a exoneração do coronel Peixoto da chefia da CRO/12.
A despeito de ser um profissional honesto, qualificado e inquestionavelmente voltado para o cumprimento das missões, não raro, o coronel Peixoto agia de forma inusitada e surpreendente — o que ocasionava dificuldade para ele próprio e para aqueles com quem ele interagia.
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Impossibilidade de transferência para o Gabinete do Ministro
Como oficial superior, em 1991, recebi o convite para ser instrutor na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Agradeci de forma efusiva, mas declarei que, por razões pessoais, não poderia aceitar o exercício dessa prestigiosa função. Qual era a razão? Eu estava sendo cogitado para servir no Gabinete do Ministro do Exército. A rigor, eram cinco candidatos à ocupação dessa vaga: três dentre eles tinham currículo pouco competitivo e aquele que competia comigo estava previsto para a nomeação de chefia de Organização Militar; então a minha chance de ser escolhido era muito grande. E se fosse para o Gabinete, haveria grande possibilidade de, após os dois anos subsequentes, ser nomeado para servir no exterior, talvez, nos Estados Unidos.
Lamentavelmente, surgiu, “fora da raia”, um sexto candidato, o tenente-coronel Rivaldo Hideo Arakaki que, em princípio, não deveria concorrer pois era da turma de 1970 e, nesse caso, seus integrantes não deveriam mais ser cogitados para a função em tela. Ora, o caboclo era amigo do Ministro do Exército e, por essa razão, foi nomeado para ocupar a vaga do Gabinete, contrariando procedimentos vigentes. Em consequência, não fui instrutor na ECEME, não fui nomeado para o Gabinete e, nessa conjuntura, não logrei servir no exterior.
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Insucesso na prorrogação do período de chefia da CRO/11
A nomeação para o cargo de chefe de Comissão Regional de Obras é efetivada para o período de dois anos. Com alguma frequência, ocorre a prorrogação para um terceiro ano e até mesmo para um quarto ano.
Com o objetivo de concluir a maioria das obras em andamento, expressei a intenção de aceitar a prorrogação do período de chefia da Comissão Regional de Obras/11ª. RM (CRO/11) que, inicialmente, abrangia o biênio 1995-1996, para incluir também 1997.
Contudo, dessa feita, o tenente-coronel Rivaldo Hideo Arakaki, que estava concluindo o período de missão no Paraguai, foi nomeado chefe da CRO/11, impedindo que eu conquistasse um período adicional que aspirei, na chefia da Comissão.
Cito pela segunda vez, neste texto, a figura do tenente-coronel Arakaki sem qualquer resquício de indignação ou ressentimento. A rigor, conforme está expresso no relato destas vivências, o cruzamento com esse prestigioso oficial e os percalços consentâneos resultaram em benefícios para a evolução de minha modesta, mas vitoriosa carreira militar.
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Indicação para o CPEAEx e para o cargo de Adido Militar
No período final da chefia da Comissão Regional de Obras/11ª. RM (CRO/11), no ano de 1996, em Brasília, eu estava cogitado para frequentar o Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército (CPEAEx), no ano seguinte, na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), no Rio de Janeiro. Esse curso foi criado para dar melhores condições profissionais para os coronéis, na continuidade da carreira e, especialmente, na possível promoção ao posto de general.
Sem que eu tivesse conhecimento, o Diretor de Obras Militares (DOM), general de divisão Odacyr Barreto Silva, dirigiu-se ao general de exército Domingos M. A. Gazzineo, chefe do Departamento-Geral de Pessoal (DGP), e solicitou que eu fosse retirado da relação de candidatos ao CPEAEx, sob a alegação de que, como engenheiro militar, eu não precisava realizar esse curso. Adicionalmente, ele solicitou que eu fosse classificado na DOM para, no ano seguinte, trabalhar com ele.
Como eu tomei conhecimento disso? Eu ainda me encontrava na chefia da CRO/11 e um vendaval atingiu a região onde residiam os oficiais-generais de quatro estrelas, destelhando uma parte da casa onde residia o general Gazzineo, mencionado chefe do DGP. Ele solicitou o apoio da CRO/11 para resolver o problema. Eu reagi com presteza e, em menos de 24 horas, fiz a vistoria técnica no imóvel, levantei as obras de recuperação requeridas e o respectivo orçamento; e me dirigi ao DGP, para entregar ao assistente da autoridade o relatório com a solução do problema. Devidamente informado, o general Gazzineo fez questão de me receber, uma vez que ele queria que, se possível, eu iniciasse os serviços imediatamente. Eu me comprometi a fazê-lo no mais curto prazo, com recursos disponíveis na Comissão, para obras emergenciais. Quando eu já estava saindo da sala, ele me chamou de volta e transmitiu que eu estava na relação para fazer o curso CPEAEx, mas o general Barreto, havia solicitado a retirada de meu nome e a respectiva classificação na DOM.
No período da chefia da CRO/11, eu criei uma excelente interação com o titular do Comando Militar do Planalto (CMP), general de divisão Luciano Phaelante Casales. A CRO/11 não era subordinada direta do CMP, mas como o general Casales tinha vocação para empreendimento, às vezes, me chamava para tratar de obras civis. Ele sabia que a CRO/11 estava construindo 164 casas e 2 prédios residenciais no Setor Militar Urbano e 400 casas em Samambaia.
Então, em uma primeira vez, ele perguntou se era possível construir 600 casas para oficiais e sargentos no imóvel do 1º. Regimento de Cavalaria de Guardas (1º. RCG). Pedi tempo para avaliar e, em 72 horas, levei para ele um estudo preliminar, mostrando a localização provável das casas, o tempo de construção e o orçamento estimativo. Ele reagiu de forma muito positiva diante da presteza e eficácia da solução apresentada. Ele levou a solução para os escalões superiores, mas não conseguiu a aprovação da proposta.
Em outra oportunidade, em face do conhecimento da existência de um terreno de propriedade do Clube do Exército, nas imediações de Brasília, o general Casales me indagou sobre a possibilidade de construção de 2.000 casas destinadas a oficiais e sargentos, com recursos financiados pela FHE/POUPEx, em uma modalidade tal que cada casa passaria a ser de propriedade do morador adquirente — este faria o pagamento de prestações para a financiadora. Claro, o orçamento de cada casa seria expressivamente mais baixo do que um financiamento normal. De forma similar, em curto prazo, fiz os levantamentos devidos e apresentei um estudo preliminar para o projeto habitacional apontando a localização provável e disposição de cada casa no terreno, tempo de construção e orçamento estimativo. Mais uma vez, o general Casales recebeu com muito agrado a proposta que implicava em ousadia e inovação procedural, porém não obteve a aprovação dos escalões superiores.
Em uma solenidade subsequente, encontrei-me com o general Casales e ele me perguntou para onde iria, após o término da chefia da CRO/11. Expliquei-lhe que seria classificado na DOM, tendo que em vista que fui retirado da relação dos oficiais que iriam fazer o prestigioso CPEAEx, inequívoco facilitador de término de carreira, em face de pedido do general Barreto. Ele ficou indignado e, sem que eu soubesse, levou o problema para o então ministro do Exército, general de exército Zenildo Zoroastro de Lucena. Inicialmente, não houve consequência.
Quando eu e meu substituto na CRO/11 fomos levar o convite para a solenidade de transmissão do cargo de chefia da comissão, ao término do encontro, o general Zenildo se dirigiu a mim e recomendou que eu prosseguisse na carreira militar e tivesse bastante calma.
Só entendi a mensagem, passado quase um ano. O general Zenildo determinou minha inclusão no curso CPEAEx do ano seguinte, ou seja, em 1998. Ademais, premiou-me com uma nomeação inesperada ...
Anteriormente, por proposta do chefe da Assessoria 1 de seu Gabinete, o ministro Zenildo alterou a norma relativa à nomeação de Adido Militar, no exterior, e incluiu os engenheiros militares no universo de escolha para esse cargo.
Em meados de 1998, eu estava na ECEME e chegou do DGP, a solicitação de remessa de documentos requeridos, relativos a 8 coronéis que cursavam o CPEAEx, e cogitados para cargo de Adido Militar. Meu nome não estava incluído na relação. A percepção inicial é que minha carreira tinha chegado ao fim; afinal, não estava sendo considerado para um curso prestigioso e, em consequência, outras eventuais missões relevantes também não estariam a meu dispor.
Envolvido em apreensão, durante uns três dias, fiquei imaginando que me caberia solicitar o desligamento do CPEAEx e a subsequente transferência para a reserva do Exército. Contudo, a curiosidade imperou: decidi telefonar para Brasília e sondar as razões que ocasionaram tal desfecho. Telefonei para uma diretoria do DGP e o telefone não foi atendido por telefonista (soldado, cabo ou até mesmo sargento); com uma grata surpresa, foi atendido por um tenente-coronel que era o encarregado de preparar os processos habituais para nomeação de Adido Militar. Expliquei para ele que era engenheiro militar, a norma mudou e acolheu integrantes dessa especialidade, eu estava no CPEAEx e não fui incluído na amostra de coronéis cogitados para a respectiva nomeação. Ele demonstrou surpresa e pediu tempo para avaliação do problema. Uma hora depois ele me telefonou, disse que a equipe não levou em conta a mudança da norma, asseverou que haveria a correção, meu nome seria considerado e me pediu para enviar cópia dos documentos via fac-símile e depois também os originais por correio expresso.
Simplificando, assevero que, passados dois meses, recebi a informação de que o ministro Zenildo tinha determinado a minha nomeação para o cargo de Adido de Defesa, da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, no Irã, para o biênio 1999-2000.
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Avaliação para promoção a general
A promoção de coronel a general de brigada no Exército envolve complexo processo de avaliação.
Uma primeira fase engloba o trabalho da Comissão de Promoção de Oficiais (CPO), no âmbito da Diretoria de Avaliação e Promoções (DAProm), do Departamento-Geral do Pessoal (DGP), na formulação do chamado Quadro Acesso por Escolha (QAE). A avaliação de um determinado coronel para a possível promoção envolve o estudo de sua vida profissional por um membro da CPO, designado relator, que apresenta relatório perante os demais membros da Comissão, os quais devem tomar uma decisão mediante voto, posicionando-o na classificação do QAE ou eliminando-o do processo.
Por ocasião de minha avaliação pela CPO, em 2002, um dos integrantes da Comissão apresentou voto contrário, aparentemente, com argumentação robusta contra a minha promoção. Nas avaliações dos anos anteriores, eu fazia parte da amostra em análise, ainda sem possibilidade de promoção, mas inserido em uma classificação que, no momento aprazado, me levaria ao sucesso. Por causa do referido voto contrário, embora mantido na relação de candidatos à promoção, eu fui deslocado para uma posição que impossibilitava meu acesso ao generalato.
A fase subsequente, final e decisiva da promoção foi a submissão dos relatórios da CPO ao Alto Comando do Exército (ACE) que, de forma similar, atua com um relator fazendo o trabalho de análise e submissão aos demais integrantes do ACE, que decidem pelo voto.
Por dever de justiça, devo dar crédito ao general de exército Licínio Nunes de Miranda Filho, meu chefe no Departamento de Engenharia e Construção (DEC), no biênio de 2001-2002, para onde fui transferido quando voltei do Irã.
Mesmo estando na reserva, ao saber da atuação da CPO contrária a meu nome, ele fez intensa campanha junto aos integrantes do ACE, com o objetivo de transmitir sua visão relativa à minha qualificação pessoal e profissional e, por óbvio, minhas supostas virtudes consentâneas com a condição de general de brigada.
O relator do processo de promoção de engenheiro militar, de coronel a general de brigada, em 2002, no Alto Comando do Exército, foi o general de exército Jorge Armando Félix, titular da Secretaria de Ciência e Tecnologia (SCT). Ao examinar o histórico militar contido em minhas Folhas de Alterações, ele ficou intrigado com o teor do elogio do coronel Peixoto e determinou a seus assistentes que pesquisassem a razão do controverso texto que, em meio à premiação rotineira, continha a já citada orientação de que “eu deveria alterar aspectos de meu comportamento se quisesse prosseguir com a carreira militar bem-sucedida”. Curiosamente, um dos assistentes era o coronel Hedel Fayad, meu colega de turma de Material Bélico, na AMAN. Foi sorte em estado puro: o Fayad era um dos mais qualificados companheiros da turma e sempre demonstrou procedimento moral e ético inexcedível. O Fayad nunca me falou, mas eu tomei conhecimento de que ele e o outro assistente transmitiram ao general Félix a informação de que eu tinha razão no pleito apresentado para o coronel Peixoto, que deu origem àquele texto; e que, ao longo da carreira, o coronel Peixoto teve notórios problemas de interação com militares superiores, pares e subordinados.
Em consequência, em face da deliberação do relator, no foro do ACE, houve posicionamento unânime em favor de minha promoção. O ACE decidiu que eu deveria ser promovido a general de brigada e, portanto, eu conquistei essa difícil láurea.
Vale destacar que o substituto do general Félix na Secretaria de Ciência e Tecnologia (SCT) — depois transformada em Departamento de Ciência e Tecnologia (DCT) — foi o general Alberto Mendes Cardoso, que se tornou meu chefe quando assumi os cargos de diretor do Campo de Provas da Marambaia (CPrM) e, depois, chefe do Centro de Avaliações do Exército (CAEx). Subsequentemente, em face de meu eficaz desempenho no CPrM e no CAEx, o general Cardoso propôs minha designação para chefe do Centro Tecnológico do Exército (CTEx), onde tive um período magnífico, pleno de aprendizado e rico em empreendimentos, mercê da elevada qualificação de seus 162 engenheiros.
Enfim, fica sobejamente evidenciado que, não raro, percalço em nossa existência pode se transformar em portador de futuro requerido, desejável e pleno de decência e ética.
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Promoção a general de divisão
Em meados da década de 2010, um Departamento do Exército contratou a empresa Orbisat para mapeamento da Amazônia, com recursos de R$ 90 milhões, a serem repassados pela Casa Civil da Presidência da República. O Centro Tecnológico do Exército (CTEx) tinha contrato com a empresa Orbisat para produção do radar de defesa antiaérea SABER M-60, cuja pesquisa & desenvolvimento estava a cargo dos engenheiros daquela organização militar e cujos recursos — um montante de R$ 30 milhões — já tinham sido colocados à disposição pela Financiadora de Projetos (FINEP).
A Orbisat tinha uma aeronave para a realização dos serviços de mapeamento e demandava pagamento de R$ 10 milhões para a aquisição de uma segunda aeronave no Reino Unido.
Como a liberação dos recursos do projeto de mapeamento atrasou, houve a tentativa do Departamento de realizar o pagamento para a Orbisat com a verba destinada ao CTEx. Então, o vice-chefe do Departamento telefonou-me e transmitiu a orientação para que fosse feito o pagamento dos recursos para a aquisição da aeronave com a verba destinada à produção do radar.
Expliquei para o vice-chefe do Departamento que não poderia realizar essa transação pelas seguintes razões:
– eu teria que determinar ao engenheiro que solicitasse à Orbisat nota fiscal de uma etapa da produção do radar, ainda não executada, e que apusesse no verso, de forma oficial, a informação de que aquela etapa tinha sido concluída; e
– eu teria que determinar ao assessor jurídico do CTEx que desse parecer favorável à legalização do processo de pagamento.
Ademais, transmiti-lhe que sendo responsável pelo emprego de cerca de R$ 100 milhões em projetos diversos, a cargo do CTEx, eu fazia enorme esforço para que as dezenas de militares e civis envolvidos nas transações agissem com rigor, correção e decência — sob o alicerce do meu próprio e indiscutível exemplo. A determinação para o pagamento da forma como foi orientado geraria dúvidas, suspeitas e a percepção de que eu poderia estar agindo de forma desonesta; e, nesse sentido, o exercício da chefia chegaria aos patamares da desmoralização, funcionando como estímulo para que alguns dentre os subordinados pudessem praticar corrupção.
O vice-chefe relatou meu posicionamento para o chefe do Departamento que, por seu turno, solicitou audiência ao comandante do Exército e expôs o problema. O comandante confirmou a decisão e orientou o chefe do Departamento para me transmitir a ordem.
Na hora do almoço, o vice-chefe do Departamento me telefonou e afirmou que o comandante do Exército ordenou que eu fizesse o pagamento. Respondi para ele que eu não cumpriria aquela ordem, fosse do chefe do Departamento, do comandante do Exército, do presidente da República ou de alguma entidade celeste que aparecesse de joelhos à minha frente — de fato, respondi de maneira impensável nas arenas terrestres.
Como eu estava na véspera da possível promoção, de general de brigada a general de divisão, naquele momento, entendi que seria barrado no último salto da carreira. Cheguei em casa e avisei para a família que minha trajetória no serviço ativo estava terminando e que se preparassem para a mudança para Brasília, em breve, comigo na condição de militar da reserva.
Como o comandante foi ao Rio de Janeiro, ele me visitou no CTEx e me questionou sobre o impedimento de contribuir para o andamento do projeto de mapeamento da Amazônia. Expliquei a ele, em detalhes, as razões em que tinha me baseado para não utilizar os recursos do radar de defesa antiaérea. Então, com argúcia e perspicácia, ele me perguntou qual deveria ser a solução para o adiantamento razoável, legal e correto para a Orbisat. Como eu tinha conhecimento dos diversos recursos orçamentários do Exército destinados ao campo da ciência & tecnologia, no âmbito do Estado-Maior do Exército, declarei que bastava o Comando do Exército alterar a destinação de algum projeto em curso, no montante requerido pela Orbisat, de tal sorte que não seria necessária qualquer ação fora dos preceitos legais. A destinação dos recursos para o radar não poderia ser alterada porque o montante não era do orçamento do Exército e sim da FINEP, associação atrelada ao Ministério de Ciência e Tecnologia. Ele ficou surpreso com a simplicidade da proposta, agradeceu e retornou para Brasília.
Não citei os nomes do chefe e vice-chefe do Departamento nem do comandante do Exército. Preservo-lhes em face de terem transmitido uma orientação errada, conquanto na busca de eficácia em um projeto fundamental para o País. O excesso de zelo reflete também o excesso de correção dessas três autoridades. Cada uma delas poderia ter agido para impedir minha promoção ao último posto de engenheiro militar do Exército; entretanto, nenhuma delas agiu nesse intento e eu fui promovido a general de divisão, contrariando o que parecia evidente como resultado de minha virtuosa teimosia.